segunda-feira, 13 de agosto de 2007

II

O garoto levantou após longas horas de sonhos. Aos poucos foi ingerindo o que restara da árvore, seu estômago foi enchendo-se. No frenêsi ele era levado aos outros planos, outras realidades, outros pontos, outras curvas ou retas. O garoto não percebera isso de imediato até que de seu pensamento brotou uma leve névoa.
Que foi levada pelo vento, esparramada pelo céu azul-claro turquesa.
Dela se formou um ser. Idêntico ao menino, era alto e longo, tinha os cabelos espumados sob o vento e se manteve no ar como espectro, submerso em um mar invisível preenchido de brisas. O garoto se levantou e sentou sobre o cotoco final da árvore. Só restava a raiz abandonada na longa paisagem. Tentou ignorar o Espectro e decidiu devolver o gesto ao longo horizonte, tocou de leve a grama enquanto o sol se preparava ao súbito desaparecer. Logo ele se uniria ao chão e deixaria só um borrão de tudo que já se foi. seria um espectáculo a qualquer um. O crepúsculo era nada mais que o passado.
O sol poente refletiu no Espectro. Agora sua aparência sublime cinza se transformara num raivoso laranja, denso e hipnotizante. O mundo continuava rodar no estômago do garoto, que teve de leve um enjoo, nada preocupante, mas mesmo assim irritante. Queria que tudo passasse, que o espectro fosse embora e que sozinho pudesse contemplar o anoitecer que viria em breve. Mas de nada adiantou pensar, logo o espectro se aproximou e tentou lhe tocar a face em vão, não havia uma matéria sequer naquele ser, o gesto não significava, era.
O toque pode não ter sido sentido no corpo do menino, mas por dentro sentiu-se atordoado, perdera de vista o lindo entardecer e se mantinha firme no Espectro. Era ele mesmo? Uma imagem? Mais uma loucura de suas tonturas?
Percebeu que o motivo de tanto estranhamento era que pela primeira vez se sentia tocado por si mesmo, não de dentro pra fora, mas de fora pra dentro. Aquilo mexeu seus nervos, que se puseram a regojitar todo o mundo.

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